TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.146 - Disponibilização: quinta-feira, 28 de julho de 2022
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Em síntese, a parte autora, ocupante do cargo de agente comunitário de saúde/endemias do Município de Salvador, busca a tutela jurisdicional para que seja reconhecido o seu direito ao recebimento da parcela denominada “incentivo financeiro adicional”,
prevista nas Portarias Federais nº 674/GM/2003, 648/GM/2006 e 650/GM/2006.
Sucessivamente, pede a condenação do Município de Salvador ao pagamento retroativo da verba denominada “incentivo financeiro adicional”.
Citado, o Município de Salvador apresentou contestação.
Audiência de conciliação dispensada.
Voltaram os autos conclusos.
É o breve relatório. Decido.
DA PRELIMINAR
No tocante à preliminar de ilegitimidade ativa, esta não merece guarida, considerando que as alegações preliminares adentram
ao mérito da ação, devendo serem analisadas no tópico correspondente. Rejeito tal proemial.
Quanto à preliminar de inépcia da inicial, não observo. Os documentos trazidos à lide pela demandante são bastantes ao deslinde do feito, não havendo afronta aos artigos 319 e 320, do CPC. Assim, rejeito a presente preliminar.
Superada essa questão, passa-se ao mérito da causa.
DO MÉRITO
Como se sabe, a Constituição Federal, mediante o art. 198, §5º, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 51/2006,
determinou que lei federal trataria do regime jurídico e da regulamentação das atividades de agente comunitário de saúde e
agente de combate às endemias:
Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único,
organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
[...]
§ 5º Lei federal disporá sobre o regime jurídico e a regulamentação das atividades de agente comunitário de saúde e agente de
combate às endemias.
[…]
Com efeito, a fim de regulamentar o disposto no referido texto constitucional, foi editada a Lei nº 11.350, de 05 de outubro de
2006, a qual estabeleceu, em seu art. 8º, que os agentes comunitários de saúde e os agentes de combate às endemias estão
submetidos, em regra, ao regime jurídico estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, sendo facultada a possibilidade de adoção de regime jurídico distinto pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, por meio de lei local.
Art. 8º Os Agentes Comunitários de Saúde e os Agentes de Combate às Endemias admitidos pelos gestores locais do SUS e
pela Fundação Nacional de Saúde - FUNASA, na forma do disposto no § 4o do art. 198 da Constituição, submetem-se ao regime
jurídico estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, salvo se, no caso dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, lei local dispuser de forma diversa.
No âmbito municipal, com espeque no art. 30, inciso I, da Constituição Federal, bem como no referido art. 8º da Lei nº 11.350/2006,
o Município de Salvador, por meio da Lei Municipal nº 7.955/2011, alterou o regime jurídico dos agentes comunitários de saúde
e dos agentes de combate às endemias do celetista para o estatutário.
Em razão disso, esses agentes passaram a integrar o Plano de Cargos e Vencimentos dos Profissionais de Saúde da Prefeitura
Municipal do Salvador, previsto na Lei Municipal nº 7.867/2010, na forma do seu art. 3º da Lei Municipal nº 7.955/2011:
Art. 3º Os Agentes Comunitários de Saúde e Agentes de Combate às Endemias passam a integrar, no que couber, o Plano de
Cargos e Vencimentos dos Profissionais de Saúde da Prefeitura Municipal do Salvador, instituído pela Lei nº 7.867, de 12 de
julho de 2010.
Assim, a partir dessa conversão de regime jurídico, os agentes comunitários de saúde e os agentes de combate às endemias do
Município de Salvador passaram a se submeter à disciplina normativa do regime jurídico estatutário municipal, e não mais àquela
disposta na Lei nº 11.350/2006 e às demais diretrizes federais.
Posteriormente, a Emenda Constitucional nº 63/2010 modificou a redação do citado art. 198, §5º, Constituição Federal, o qual
passou a estabelecer que lei federal versaria não apenas sobre o regime jurídico e a regulamentação das atividades de agente
comunitário de saúde e agente de combate às endemias, mas também acerca do piso salarial profissional nacional e as diretrizes
para os Planos de Carreira destes.
Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único,
organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
[...]
§ 5º Lei federal disporá sobre o regime jurídico, o piso salarial profissional nacional, as diretrizes para os Planos de Carreira e
a regulamentação das atividades de agente comunitário de saúde e agente de combate às endemias, competindo à União, nos
termos da lei, prestar assistência financeira complementar aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, para o cumprimento
do referido piso salarial.
[…]
Nesta senda, a Lei nº 12.994/2014 acresceu à Lei nº 11.350/2006 o piso salarial profissional nacional dos agentes comunitários
de saúde e dos agentes de combate às endemias, bem como estabeleceu algumas diretrizes acerca dos incentivos financeiros
à categoria.
Neste contexto, faz-se necessário lembrar que o processo de interpretação e aplicação do direito consiste em fenômeno complexo. Vale dizer, a interpretação isolada de determinado enunciado normativo pode implicar na sua contradição com todo o sistema,
sendo tal hipótese capaz de culminar na restrição ou extrapolação da finalidade da norma.
Destarte, para não incorrer em tais situações, afigura-se imprescindível a análise sistemática do texto normativo, porquanto essencial para fins de caracterização da unidade, coerência e completude do ordenamento jurídico.
A corroborar o exposto acima, insta transcrever as lições Luís Roberto Barroso: