Disponibilização: Segunda-feira, 5 de Setembro de 2011
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I
São Paulo, Ano IV - Edição 1031
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obrigação de indenizar; a pretensão das autoras em receber danos morais e materiais fica impugnada; os valores sugeridos na
inicial são abusivos e configuram enriquecimento indevido; a ação é improcedente. Com a resposta, vieram os documentos de
fls. 93/181. Réplica das autoras a fls. 184/188. O feito foi saneado a fls. 208. Veio para os autos a certidão de fls. 212, que se
refere ao inquérito policial instaurado a respeito dos fatos. Na audiência, foram ouvidas três testemunhas arroladas pelas partes
(fls. 231/238). As partes ratificaram, por memoriais, os termos da petição inicial e da contestação (fls. 243/248 e 250/265). O
Ministério Público opinou pelo indeferimento do pedido inicial (fls. 269/272). É o relatório. DECIDO. A ação é improcedente. É
fato incontroverso que COSME SOUZA SILVA sofreu um acidente de trabalho e veio a óbito no dia 28 de junho de 2009, quando
exercia a função de “caldeireiro” na IESA PROJETOS, EQUIPAMENTOS E MONTAGENS S/A (atestado de óbito de fls. 58 e
laudo médico de 59). O instituto de criminalística compareceu ao local do acidente e apurou o seguinte (fls. 27/30). “Na ocasião
dos fatos, estava sendo feito teste hidrostático em um equipamento conhecido como trocador de calor. Uma das etapas deste
ensaio consistia em realizar torque nos parafusos através de ferramenta específica. Quando dos exames, sobre o trocador de
calor havia correntes fixadas à ponte rolante acionada por controle remoto que, por sua vez, também sustentava um cabo de
aço, o qual era utilizado para ajustar, internamente, peças integrantes do equipamento. De acordo com informações, momentos
antes do término de seu turno de trabalho, a vítima estaria posicionada em cima do trocador de calor, nas proximidades da
flange, manejando a ponte rolante, objetivando içar as correntes, quando foi atingido por uma delas. Na atividade desenvolvida
pela vítima, o uso das correntes não era necessário. A presença destas peças naquele setor se deve ao fato de que, juntamente
com o cabo de aço, estavam ligadas à mesma ponte rolante. Foi constatado que, acidentalmente, elos das correntes podem ter
ficado aprisionadas no vão formado por dois parafusos do trocador de calor. Parece ter ocorrido que, afastado do campo de
visão da vítima, os elos presos foram suspensos pela ponte rolante até o momento em que aconteceu a sua abrupta soltura em
movimento de ricocheteio, culminando com o impacto. Os peritos, então, chegaram às seguintes conclusões: “Como a presença
das correntes naquela atividade era dispensável, numa operação simples deveriam ter sido retiradas antes do início do teste
hidrostático; Havia uma plataforma metálica posicionada ao lado do trocador de calor sobre qual o operador deveria permanecer
durante a fase em que o cabo de aço era conectado à estrutura do trocador de calor”. As fotografias juntadas com o laudo
mostram claramente: o trocador de calor ou resfriador (fls. 31); o suporte existente sobre o trocador de calor onde é feito o
ajuste com o cabo de aço (fls. 32); a plataforma metálica onde os funcionários devem se posicionar (fls. 33); a ponte rolante com
as correntes e o cabo de aço (fls. 35); o conjunto de correntes que deveria ter sido retirada antes do início do teste hidrostático
(fls. 36); o trocador de calor, encontrado com as correntes à sua volta e sobre sua superfície (fls. 37 e 38); o controle remoto que
aciona a ponte rolante (fls. 40). A IESA S/A também fez um relatório interno sobre o acidente e chegou à conclusão semelhante
(fls. 47): “O colaborador Cosme Souza Silva posicionou o carro da ponte rolante para realizar o alinhamento do cabeçote do
trocador de calor. O colaborador utilizou o gancho auxiliar da ponte rolante para realizar o içamento do cabeçote, pois havia uma
corrente de quadro ramais presa no gancho principal da ponte rolante; Após a realização do alinhamento do cabeçote do trocador
de calor, Cosme Souza Silva acionou o controle da ponte rolante, sentido subida, para recolher o gancho auxiliar que havia
utilizado na operação. Em seguida, acionou o comando da ponte rolante, sentido subida, para realizar o recolhimento do ganho
principal; Durante o recolhimento (subida) do ganho principal da ponte rolante, o ganho de um dos ramais da corrente enroscou
na flange do trocador de calor, vindo a ser projetado contra a cabeça do colaborador”. Concluiu a empresa que o caldeireiro
Cosme foi negligente e deu causa ao acidente: a) ao manter a corrente que não foi utilizada e estava presa no gancho principal
da ponte rolante em local que oferecia risco de enroscar durante a movimentação; b) por ter se posicionado incorretamente. O
inquérito policial instaurado para a apuração de eventual crime de homicídio culposo (relatório a fls. 44/45) foi arquivado em
02.06.2010 a pedido do Ministério Público (certidão de fls. 212). Foram ouvidas, durante a instrução, três testemunhas: Wilson
Fernandes é mecânico montador da IESA e estava perto de Cosme quando houve o acidente. Segundo a testemunha, Cosme já
estava indo embora e resolveu “dar o torque” no “resfriador”: “Ele subiu na peça e a ponte baixou; eu vi ele começar a erguer a
peça com o gancho da ponte; eu gritei para ele parar, porque a corrente estava em cima do tirante; foi quando deu o estouro da
corrente; eu só vi que ele balançou a cabeça e ficou parado; ele começou a cair de ponta cabeça”. A testemunha ainda esclareceu
o seguinte: Cosme estava usando os equipamentos normais de proteção; o acidente não teve nenhuma relação com a falta de
equipamento de segurança; Cosme tinha experiência naquele serviço; para montar o equipamento, a pessoa deve ser experiente;
os caldeireiros também recebem treinamento; os empregados usam uma plataforma própria quando é necessário subir. Ricardo
Ardito é coordenador de produção e declarou, de relevante, o que segue: “Saiu do local uns 20 minutos antes do acidente;
Cosme estava no final de suas atividades e disse que estava recolhendo a corrente e as ferramentas para poder ir embora; o
trabalho de recolher a corrente é habitual e simples; todos os caldeireiros fazem esse trabalho; o Cosme tinha experiência
nessa atividade; era o caldeireiro mais experiente que a empresa tinha na época; segundo o apurado, o acidente ocorreu
quando ele estava em cima do trocador de calor ou “resfriador”; essa conduta não é normal, já que ele deveria subir na plataforma
que existe ao lado; acredita que ele subiu no trocador de calor por ser mais fácil e para ganhar mais tempo; as atividades mais
corriqueiras são acompanhadas pelo líder da área; no momento do acidente, ele estava fazendo a troca de turno; no dia dos
fatos, Cosme começou a trabalhar às sete horas da manhã, que é o seu horário habitual; geralmente o caldeireiro é acompanhado
por um ajudante; no dia dos fatos, Cosme estava sozinho porque era o horário da troca de turno; o líder da área costuma
permanecer sempre no local e fiscaliza uma média de empregados; Cosme participava dos treinamentos e conhecia bem as
regras de segurança; ele estava utilizando os equipamentos de segurança”. Osvaldo Barcellos é técnico de segurança do
trabalho e trabalhava na área da caldeiraria. A testemunha disse o seguinte: “O recolhimento das correntes pode ser feito do
piso ou da plataforma que existe no local. Não sabe dizer porquê Cosme subiu no resfriador para recolher o equipamento. Os
funcionários recebem treinamento para realizar essa atividade. Cosme era habilitado para isso. Os caldeireiros usam todos os
equipamentos básicos de segurança. Em cada área, há um líder que é responsável pela fiscalização dos trabalhos; no dia do
acidente, o líder já havia encerrado o seu expediente; Cosme tinha experiência; ele já havia terminado o seu serviço e estava
apenas recolhendo o material para ir embora”. Os documentos juntados pela IESA, a fls. 107/109, demonstram que Cosme foi
contratado em 08.12.2003 como “caldeireiro” e tinha como uma de suas funções básicas “montar conjuntos ou subconjuntos de
equipamentos”. Ao contrário do que foi sustentado na petição inicial, também ficou comprovado que Cosme usava os
equipamentos de segurança individual e recebeu de sua empregadora inúmeras instruções para exercer a contento as suas
atividades (fls. 121/181). Como bem mencionou o Dr. Promotor de Justiça, não se aplica no caso concreto a “teoria do risco”,
disposta no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, cabendo ao prejudicado alegar e comprovar que a empregadora agiu
com dolo ou culpa em qualquer de suas modalidades. O artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição Federal, discorrendo sobre os
direitos dos trabalhadores, estabelece: “seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização
a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”. Não há dúvidas, então, que o acidente ocorreu por culpa exclusiva
da vítima, que não seguiu as normas básicas de segurança. A partir do depoimento das testemunhas, do relatório feito pela
IESA, do exame pericial realizado no local dos fatos e dos vários documentos juntados, conclui-se o seguinte: - Cosme era um
funcionário experiente e estava fazendo uma atividade rotineira e simples no fim de sua jornada de trabalho (teste hidrostático
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º