TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.274 - Disponibilização: sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023
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17ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8054843-86.2022.8.05.0001
Órgão Julgador: 17ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
INTERESSADO: Em segredo de justiça
Advogado(s): MARIA AUXILIADORA OLIVA RIBEIRO (OAB:BA22556)
REU: BRADESCO SAUDE S/A
Advogado(s): FÁBIO GIL MOREIRA SANTIAGO (OAB:BA15664)
SENTENÇA
MATHEUS ARRUDA RIBEIRO, devidamente qualificado nos autos, por intermédio de advogado regularmente constituído, propôs a presente AÇÃO ORDINÁRIA em face de BRADESCO SAÚDE S/A, igualmente qualificado.
Afirmou o requerente ser associado da empresa ré, na qualidade de dependente do seu genitor Paulo Moacyr Vieira Ribeiro Filho, através do plano empresarial, acomodação quarto, (Saúde Top- rede nacional) Cartão Nacional de Saúde sob nº
887.512.200019.025, (documento anexo).
Alegou que encontrava-se internado no Centro para tratamento de Dependência Química – VILA SERENA Bahia, desde
01/04/2022, em caráter de urgência, em razão a dependência química por uso abusivo e compulsivo de opioides, com episódios
depressivos moderado, necessitando de um período estimado de 180 (cento e oitenta) dias, em caráter de emergência devido a
vulnerabilidade do vício acometido pelo Requerente.
Destacou que, mesmo diante da complexidade do caso, o Plano de Saúde Bradesco, só autorizou a cobertura da internação
integral pelo período de 30 (trinta) dias anual, ou seja, de 01/04/2022 a 01/05/2022, os demais períodos solicitados pelo médico
credenciado, só arcaria com 50% do custo da internação e os outros 50% do Paciente/Requerente, mesmo com recomendação
médica para mais 180 (cento e oitenta) dias de tratamento.
Diante do exposto, requereu: a) a concessão da gratuidade de justiça; b) a inversão do ônus da prova; c) o deferimento da medida liminar; d) condenar o réu na obrigação de fazer - autorizar e custear integralmente durante todo o período em que perdurar
o tratamento, os procedimentos necessários e a internação do Requerente no Centro de Tratamento de Dependência Química
– VILA SERENA/ BAHIA, com a confirmação definitiva da medida liminar deferida, bem assim, condenar o réu no dever de indenizar o autor em DANOS MORAIS no valor arbitrado por este Juízo; e) a condenação ao pagamento das custas e honorários.
Com a inicial, foram coligidos documentos sob ID 195687180.
Deferiu-se o pedido de assistência judiciária gratuita e o pedido liminar. Outrossim, determinou-se a inversão do ônus da prova.
(ID 196673109)
Devidamente citada a parte ré ofereceu contestação no evento de ID 203632954. Não arguiu preliminares. No mérito, afirmou
que o plano da parte autora tem cobertura para internação psiquiátrica, conforme consta nas Condições Gerais da apólice. Destacou que haverá coparticipação da segurada a partir do primeiro dia que ultrapassar os prazos definidos no contrato, dentro de
um mesmo período anual de vigência do seguro. Alegou que a Seguradora de saúde Ré autoriza a internação de seus beneficiários em clínica psiquiátrica credenciada. Entretanto, a partir do 31° dia de internação, haverá coparticipação da segurada. Por
fim, pugnou pela improcedência dos pedidos formulados na exordial.
Contestação instruída com documentos sob ID 203632955 ao 203638064.
Em seguida, o autor apresentou réplica no evento de ID 211192509.
Parecer do Ministério Público do Estado da Bahia, noticiando que o autor atingiu a maioridade no do 20 de julho de 2022, razão
pela qual, requereu a exclusão do parquet do feito. (ID 275818326).
É o relatório.
Posto isso. Decido.
O feito já está instruído, não havendo necessidade de produzir outras provas, visto que a matéria de mérito ventiladas nos autos
é unicamente o julgamento antecipado da lide (art. 355, NCPC).
Passando à análise do mérito, a relação existente entre as partes decorrente de contrato de prestação de serviços de assistência médica, hospitalar e complementar restou inconteste, subsumindo-se às normas do Código de Defesa do Consumidor, Lei
8.078/90, e também às normas da Lei 9.656/98.
Na presente lide, discute-se a manutenção da internação da autora em clínica psiquiátrica sem limitação de prazo, a despeito de
conter previsão no contrato firmado entre as partes de limitação de cobertura de internação psiquiátrica até o período máximo
de 30 dias.
Compulsando os autos, verifica-se que foi comprovada a situação de emergência na internação da parte autora, consoante
declaração médica de ID 195687180 (fl. 04), que apontou a necessidade da permanência de sua internação para tratamento
psiquiátrico por período de 180 (cento e oitenta) dias, em razão da vulnerabilidade do autor.
A ré alega que seu contrato de plano de saúde encontra-se em conformidade com a regulamentação da ANS, e que prevê cobertura total para internação psiquiátrica por 30 (trinta) dias, devendo, após este prazo, haver co-participação entre o beneficiário
e a seguradora.
No que pese à imposição de limite temporal à internação, tratando-se de contrato de adesão, as cláusulas devem ser interpretadas da forma mais favorável ao consumidor, em atenção aos princípios da boa-fé objetiva e da equidade, e não podem
estabelecer obrigações consideradas abusivas que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, razão pela qual a
disposição contratual limitativa do tempo de internação do paciente se afigura nula, conforme art. 51, IV, do Código de Defesa
do Consumidor.
Assim, ainda que, a princípio, a cláusula limitativa de tempo de internação seja permitida por Resolução da ANS, ela é considerada abusiva, pois só o médico pode aferir o tipo e o período de atendimento do paciente.
Aliás, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já firmou orientação nesse sentido, conforme Súmula nº 302, in verbis:
“É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado.”