Disponibilização: Quarta-feira, 21 de Julho de 2010
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Capital
São Paulo, Ano III - Edição 758
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dívidas da sociedade no mercado, além de débitos de aluguéis em contrato celebrado em nome de sua irmã. Diz que em janeiro
de 2.009 tentou entrar no estabelecimento, sendo impedido pela autora, ocasião em que constatou que já não havia mercadorias
no local, inclusive os móveis haviam desaparecido, encontrando-se o local completamente vazio. Para evitar maiores prejuízos
promoveram a lacração do imóvel e o devolveram ao locador. Afirma o inadimplemento da autora, que se apossou do
estabelecimento, desapareceu com as mercadorias, contraiu dívidas e não quitou a obrigação que assumiu , buscando a rejeição
da pretensão de rescisão do negócio e inexigibilidade dos cheques, bem como cancelamento dos protestos. Requer a
improcedência da ação e a condenação da autora como litigante de má-fé. Réplica a fls. 266/286. Designada audiência de
conciliação, restou infrutífera. O feito foi saneado, com o afastamento das preliminares argüidas em contestação e fixação dos
pontos controvertidos, deferida a produção de prova documental e oral. Em audiência de Instrução e Julgamento foram ouvidas
testemunhas arroladas pela autora e réu, com o encerramento da instrução e fixação de prazo para memoriais, juntados a fls.
400/406 e 407/411. É O RELATÓRIO. D E C I D O. Autora e réu tornaram-se sócios na empresa “Distribuidora Master Imports
Comercial de Brinquedos Ltda” em junho de 2.008, na proporção de 50% das quotas a cada. Em outubro do mesmo ano
resolveram por fim à sociedade, ajustando a venda das quotas de Rodrigo a Priscila pelo preço de R$ 196.705,40, ajustado o
pagamento em 24 parcelas, sendo a primeira de R$ 9.306,00, vencida em 20.10.08; a segunda de R$ 9.067,40, vencida em
20.11.08 e as 22 subseqüentes no valor de R$ 8.106,00, representadas por cheques de emissão da autora, com vencimento
todo dia 20 de cada mês. As três primeiras prestações foram pagas. A autora busca a rescisão do contrato de cessão de quotas
e conseqüente inexigibilidade dos cheques a ela vinculados sustentando o descumprimento de obrigação contratual de alteração
do contrato social pelo réu e a adoção de comportamento que impediu o desenvolvimento das atividades comerciais, conduzindo
ao encerramento da empresa. Em que pese restar evidenciado o comportamento abusivo adotado pelo réu (e sua irmã), o fato
é que foi ele subseqüente à suspensão do pagamento por parte da autora e a decisão de encerramento das atividades da
empresa. A prova produzida demonstra de maneira clara que a empresa vinha passando por dificuldades financeiras, o que
levou a autora a decidir pelo encerramento das atividades, passando a promover restituição de mercadorias a fornecedores já
no início de 2.009, com o objetivo de minimizar os débitos já existentes. Embora a petição inicial descreva que o réu teria se
recusado a promover a alteração do contrato social porque a sociedade teria se tornando lucrativa em função dos investimentos
realizados pela autora, o relato da própria Priscila à autoridade policial (fls. 94/95) e o de seus funcionários Tabata Souza de
Oliveira e Jefferson da Silva Rodrigues conduz à conclusão contrária, sendo afirmado pelo último que no início de 2.009 se
percebeu que não haveria meios de manter a loja, que possuía dívidas, o que motivou a decisão de restituir os produtos aos
fornecedores para quitar as dívidas existentes (fls. 357/364 e 365/371). O testemunho de Amanda Rampazzo Peres Pinto
descrevendo a boa saúde financeira da empresa em dezembro de 2.008 (fls. 392) restou isolado e dissociado do conjunto
probatório, devendo ser desconsiderado. Por outro lado, diante da difícil situação financeira da empresa, forçoso reconhecer
que a ausência de alteração do contrato social era fato prejudicial ao réu, que poderia responder perante terceiros pelos débitos
contraídos em momento antecedente a seu desligamento formal da sociedade, e não à autora, que poderia ter resolvido o
problema com simples ajuizamento de obrigação de fazer para compeli-lo à transferência das quotas, inclusive com consignação
judicial das prestações até que a alteração fosse efetivada. Daí porque não há como se acolher o pedido de rescisão da cessão
de quotas por inadimplemento do réu, o que apenas seria possível se comprovada a alegação de que deu causa ao encerramento
das atividades da empresa impedindo a continuidade dos negócios pela autora. O que se infere do conjunto probatório é que a
autora já vinha adotando medidas de fechamento do negócio, e portanto, mesmo que o réu não tivesse agido, a conclusão
natural seria o término das atividades da empresa, com a restituição do prédio locado. O maior ou menor tempo para o
encerramento das atividades interferiria apenas na quantificação dos prejuízos. Ocorre que foi justamente a constatação pelo
réu de que a autora vinha se desfazendo do estoque o conduziu à adoção de uma série de medidas equivocadas e abusivas,
que redundaram em inúmeros Boletins de Ocorrência. Em 1º. de fevereiro o desentendimento entre as partes resultou no
deslocamento dos sócios à Delegacia de Polícia, onde ocorreram acusações mútuas de desvio de mercadorias e descumprimento
e obrigações assumidas (fls. 93/95). Poucos dias depois, em 5 de fevereiro, a irmã do réu, pessoa em nome de quem fora
locado o imóvel onde estabelecida a sociedade, lacrou as portas do estabelecimento e impediu que Priscila e seus funcionários
ingressassem no local, que foi restituído ao locador vazio e sem o consentimento da autora, em 11 de fevereiro de 2.009 (fls.
88/90 e 192). Em que pese a assertiva do réu de que o imóvel foi deixado vazio e abandonado pela autora, não é o que se extrai
do conjunto probatório. Os funcionários da autora informaram que vinham fazendo a devolução de mercadorias aos fornecedores
e em determinado dia, quando chegaram ao local a loja estava vazia e foram impedidos de ingressar no local. Uma das
funcionárias chegou a elaborar Boletim de Ocorrência porque suas coisas teriam ficado retidas na loja (fls. 91). Vamberto Souza
de Oliveira, motorista de caminhão, foi contratado para realizar o transporte de objetos do imóvel da avenida Vautier - Pari - São
Paulo para a cidade de Guarulhos. Ouvido na fase policial afirmou que se dirigiu ao local referido no dia 9 de fevereiro, por volta
de 8:00 horas da manhã, tendo efetuado carregamento de mercadorias e prateleiras em duas viagens, tendo encerrado o
transporte por volta de meia noite. Disse que recebeu o pagamento de R$ 500,00 de Leandro, cunhado de Rodrigo (marido de
sua irmã Andréia) e que o local da entrega era justamente a casa de Rodrigo (fls. 321/322). Em juízo prestou declarações vagas,
afirmando não saber informar quem o havia contratado e desconhecer a situação do imóvel, justificando que não teria ingressado
no local, mas permanecido no caminhão aguardando o carregamento (fls. 393). As testemunhas arroladas pelo réu apresentaram
declarações sem consistência, não trazendo mínimos elementos quanto ao tempo em que os fatos ocorreram, com evidente
preocupação de amparar a afirmação da contestação quanto à autora ter desviado mercadoria com o propósito deliberado de
não responder pelas obrigações assumidas. Limitaram-se a afirmar que um caminhão teria transportado produtos para Fortaleza,
sem mínima precisão temporal, de maneira a tornar irrelevantes os relatos, já que amplamente admitido nos autos que os
produtos estavam sendo removidos daquele local e devolvidos aos fornecedores. Finalmente, de nenhuma credibilidade o
testemunho de Andréia, visto que mentiu sobre elemento essencial, qual seja, seu vínculo com a sociedade. Veja-se que diante
da acusação de que havia lacrado e impedido o ingresso de Priscila e seus funcionários no estabelecimento comercial, declarouse sócia de fato da empresa, justificando que seu irmão Rodrigo figurava no contrato porque possuía restrições creditícias em
seu nome (fls. 325/326). Em juízo disse que não mantinha qualquer vínculo com a sociedade, senão o fato de constar como
locatária do imóvel (fls. 381/387). De todo o exposto, inegável que o comportamento do réu está longe de ser admitido como
válido ou legítimo. Verificado o descumprimento da obrigação de pagamento das prestações mensais assumidas pela autora e
evidenciado o receio de dilapidação do patrimônio pelo esvaziamento do estoque, deveria ter se valido da ação cautelar de
arresto para assegurar o cumprimento da obrigação, e não se apropriado do restante do estoque, invadindo imóvel que era
ocupado pela sociedade da qual havia se retirado, prevalecendo-se do fato de que o contrato havia sido celebrado no nome de
sua irmã. O comportamento adotado mostrou-se, no mínimo, contraditório, pois foram exercidos atos como se permanecesse
como sócio, mas justamente com o objetivo de garantir o cumprimento de obrigação relacionada a sua exclusão da sociedade e
conseqüente recebimento pelas quotas cedidas. Contudo, como já exposto, na medida em que não foi a conduta do réu a causa
determinante do encerramento das atividades da sociedade, tratando-se de processo iniciado pela própria autora em razão das
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