Disponibilização: quarta-feira, 15 de junho de 2022
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III
São Paulo, Ano XV - Edição 3528
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indigno de credibilidade) que os policiais possam engendrar versão incriminadora contra o réu, imbuídos por sentimentos
subalternos dignos de censura. As circunstâncias em que as drogas foram apreendidas ‘confirmam sua destinação, pois a
quantidade, o fracionamento das drogas, o local da ocorrência (conhecido ponto de traficância predinhos do Profast ou “colorido”)
indicam que eram voltadas à venda e não para o consumo próprio do réu. A negativa do réu não deve impressionar, pois ele não
está obrigado a fazer prova contra si mesmo (Nemo tenetur se detegere) e a tentativa de furtar-se às consequências penais é o
normal e esperado na grande maioria das ações criminais, principalmente em casos desta natureza. Inexistente contraprova
hábil a desqualificar a prova acusatória, o Juízo deve orientar-se pela verdade processual objetivamente existente no processo,
sem margem para decisionismo ou dúvida subjetiva. A dúvida deve estar alicerçada na insuficiência de provas ou na existência
de provas com versões conflitantes, antagônicas. Não é possível externar convicção motivada a partir de ilações particulares do
julgador, pois a motivação jurídica decorre do processo de persuasão racional, assim entendido como aquele que pode ser
devidamente explicado com base nos elementos presentes no processo e não no âmago psicológico da entidade decidente. A
dúvida capaz de favorecer o réu deve estar sustentada em contraprovas e não meramente a partir de argumentações, sob pena
de contemplar-se indevidamente a subjetividade e o “decisionismo”. Nesse sentido, os ensinamentos de FRAMARINO DEI
MALATESTA, o qual afirma que o princípio ontológico coloca o ônus de prova a cargo da acusação, quando considera as duas
asserções contrárias, do acusador e acusado, antes da produção de provas. Mas, desde o momento em que o acusador reuniu
as suas provas para sustentar a sua asserção, se o acusado, em contradição à asserção do acusador, emite simples asserção
contrária, não faz mais que contrapor uma asserção não provada a uma provada e como esta tem direito de ser tomada como
verdadeira de preferência a não provada, sendo a presunção da verdade, neste segundo momento, a favor do acusador, a
obrigação da prova incumbe ao acusado (A Lógica das Provas em Matéria Criminal, Campinas: Conan 1995 v. I p. 45-146
destaque do Juízo). No que tange à alegada drogadição, é sabido que a condição de usuário não é incompatível com a
traficância. Noutras palavras, “Ainda que admissível a circunstância de que o réu padeça de toxicomania, a alegação de ser
usuário de droga tem-se que em nadamodifica a imputação, pois perfeitamente conhecida a figura do viciado-traficante” (STF2ªTurma, HC-MC73.197/GO, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 22.11.1996). Sobre a questão já se manifestou a Colenda Corte
Paulista: - A alegação de viciado não obsta o reconhecimento da figura do traficante, mormente na hipótese vertente, em que
ambas se mesclam num mesmo agente, preponderando a última, de maior gravidade (TJSP HC 42.229-3 Rel. Onei Raphael
RJTJSP101/498). Diante de tal panorama, não se ressente este Juízo de qualquer dúvida a respeito da procedência da ação
penal. Em suma, o caso sub examen evidencia a prática de crime diverso do simples porte para uso exclusivo e pessoal de
entorpecentes. Revela, na verdade, manutenção de drogas para entrega também a terceiros, ficando afastada a possibilidade
de desclassificação da conduta para os moldes do art. 28 da Lei 11.343/2006. Presente a tipicidade delitiva na forma capitulada
na denúncia e não havendo justificativas ou dirimentes capazes de afastar a antijuridicidade da conduta e culpabilidade do réu,
a condenação é medida necessária para a concretização dos escopos de prevenção geral positiva e prevenção especial
colimados pelo sistema punitivo, além de restabelecer o princípio da prevalência do Direito e atestar a vigência da norma penal
violada. ***** Ex positis, JULGO PROCEDENTE a denúncia de págs. 48/49, para CONDENAR SAMUEL APARECIDO DOS
SANTOS pela prática do crime capitulado no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, passando a dosar-lhe as penas, nos
termos do artigo 68 do Código Penal e artigo 42 da Lei de Drogas. Analisadas as diretrizes do artigo 59 do Código Penal e 42 da
Lei 11.343/2006, observa-se que o modus operandi não recomenda que seja acentuada a pena, pois a culpabilidade é normal à
espécie. Poucos elementos foram coletados acerca de sua conduta social e personalidade, razão pela qual não influenciam
negativamente a dosimetria. Além disso, deixo transparecer que tais circunstâncias judiciais se analisadas em detrimento do réu
evidenciam acolhimento do direito penal de autor, fenômeno indesejável e antigarantista que não conta com o aval deste Juízo.
Cabe ressaltar, ainda, a exasperação também não é medida a se impor, neste caso, em relação à natureza das drogas. Crack,
cocaína e maconha são entorpecentes considerados “comuns” encontrados em qualquer cidade e apreendidos com frequência
diária em São José do Rio Pardo. A interpretação da Lei Penal exige que este Juízo considere que apenas substâncias
excepcionais como ópio, LSD, ecstasy, heroína, poderiam justificar a majoração da pena com base na natureza do entorpecente.
Na análise determinada pelo art. 42 da Lei de Drogas tem-se que o critério “quantidade” compreende duas variáveis: 1ª O peso,
massa, das substâncias propriamente ditas (neste caso insuficiente para gerar acréscimo na pena, pois a apreensão total foi de
cerca de 14,20 gramas). 2ª A diversidade, variedade das substâncias, pois em “quantidade” de drogas podemos ter pequenas
ou grandes porções de 1,2,3 ou mais drogas diferentes. Analisando estes itens o Juízo encontra campo para necessário
acréscimo, pois a quantidade-variedade de drogas diferentes (no caso duas cocaína e crack) impõem aumento de pena, uma
vez que o traficante que tem consigo uma variedade de tóxicos está pronto a atender parcela de usuários mais ampla, alcançando
“maior clientela” e demonstrando nível superior de periculosidade do que aquele que fornece apenas uma espécie de droga.
Assim, deve receber a reprimenda diferenciada em estrita observância ao mandamento constitucional de individualização da
pena. O motivo do delito se constitui pela vontade de locupletar-se com a venda de entorpecente o que já está albergado no
próprio tipo legal. As circunstâncias do delito não destoam daquelas em que ocorrem crimes desta natureza, ao passo que não
há elementos para aferir se as consequências foram graves. À luz dessas circunstâncias é que fixo a pena-base privativa de
liberdade para o crime capitulado no artigo 33, caput da Lei 11.343/2006, 1/6 (um sexto) acima do mínimo legal, por força da
diversidade (1/6) de entorpecentes estabelecendo-a em 05 (cinco) anos, 10 (dez) meses de reclusão e 583 dias-multa. Assim,
fixo a pena em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 dias-multa. O réu é reincidente, pois condenado definitivamente
aos 12.03.2018 nos autos da ação penal 0000784-37.2019.8.26.0575 pg. 36. Deve suportar, inexoravelmente, novo acréscimo
capaz de guindar a pena ao nível de 6 anos, 9 meses e 20 dias de reclusão e 680 dias-multa. Inviável a concessão da minorante
prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006, diante da reincidência. Além disso, o réu dedica-se a atividades criminosas, pois
também foi condenado em primeira e segunda instância por fato ocorrido aos 13.05.2021 processo 1500406-36.2021.8.26.0575,
acórdão de pgs. 200/218, juntado pela própria defesa. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, inquéritos
policiais e ações penais em andamento, bem como condenações por fatos posteriores podem obstar a aplicação do benefício
descrito no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, porquanto demonstra a prática reiterada de condutas nocivas, bem como a
incursão do acusado em atividades criminosas (AgRg no Agravo em Recurso Especial nº 1.594.419/RS (2019/0294417-1), 5ª
Turma do STJ, Rel. Reynaldo Soares da Fonseca. j. 17.12.2019, DJe 19.12.2019). E ainda: “A teor do entendimento firmado na
Terceira Seção desta Corte Superior, ao julgar o EREsp nº 1.431.091/SP, em sessão realizada no dia 14.12.2016, inquéritos
policiais e ações penais em curso podem ser utilizados para afastar a causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33,
§ 4º, da Lei nº 11.343/2006, por indicarem que o agente se dedica a atividades criminosas.” (AgRg no AgRg no Agravo em
Recurso Especial nº 1.575.466/ES (2019/0264981-9), 5ª Turma do STJ, Rel. Reynaldo Soares da Fonseca. j. 19.11.2019, DJe
03.12.2019) À míngua de causas gerais ou especiais de diminuição ou aumento de pena, torno em definitiva a pena supra. Fixo
o regime FECHADO para início do cumprimento de pena, em consideração ao montante de pena aplicada e a reincidência, nos
termos do art.33, § 2º, alínea b, c.c. art. 59, todos do Código Penal. Mantido o caráter hediondo da conduta, o regime inicial
FECHADO é o único capaz de romper a “teia” criminosa em que o réu encontra-se envolvido, afastando-o do contado com sua
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º